quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Alzheimer

© Márcia Sanchez Luz

Em memória de minha mãe, Nilze, que ontem fez sua passagem e nos deixa cheios de saudades...






"Não vou sentir saudades.
Vou guardar você no meu coração."

Francisco Sanchez





O olhar distante, a fala deprimida,
uma canção antiga na vitrola,
a busca inútil no vazio da vida
que traz no vento a dor que desconsola.


Chegando a noite veste a camisola
e nutre a espera, como se fingida
fosse em querer lembrar porque se isola
de um mundo onde a memória é já perdida.

De manhã cedo os pássaros deslizam
por sobre seu jardim para avisar
que o dia que chegou é na verdade

um tempo onde a palavra é só saudade
de um astro que não pode mais brilhar.
Recordações agora se anarquizam...

(Do livro "Quero-te ao som do silêncio!")

10 comentários:

  1. Márcia, leio Alzheimer como mais um soneto seu e só posso cumprimentar sua costumeira boa escansão, sua sonoridade e todas essas coisas, como você sabe. Mas há grande uma diferença aqui, na minha leitura inclusive, já que sei em que circunstância de sua realidade vivida ele foi inspirado. Não posso atribuí-lo a sua imaginação, à Pessoa. Isto o torna todo especial, como soneto. Aqui, a poetisa não é uma fingidora, antes poetiza sobre dor recente e que deveras sente, a de perder um ente tão próximo, que agora descansa certamente de outro sofrimento associado a sua doença. Quisera ter palavras de conforto que realmente a confortassem, mas bem sei da da inutilidade de tentar isto. Simbolizo então minhas condolências fazendo silêncio em memória de sua mãe, Nilze, que fez sua passagem e deixou saudades.
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  2. Oi Márcia.
    Os verdadeiro poetas demonstram suas dores e sua saudades
    através da válvula de escape que Deus colocou a nossa disposição. Poetas não precisam fingir sempre. Porque, as vezes, realmente, escrevem a dor que deveras sente. Sei que todos nós temos nosso
    tempo marcado e a volta de entes queridos pra casa do pai, geralmente nos deixa triste, mas devemos compreender. É la que esta a verdadeira felicidade. e o reencontro é certo.

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  3. Meus pêsames, Marcinha. Eu também perdi uma irmã querida na semana passada. Era um ano mais nova do que eu. Infarto fulminante!

    Quanto ao soneto, está uma prima-obra.

    Abraços,

    Cicero

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  4. Dizer o quê, diante da partida dos que amamos, da mãe da gente indo embora, mas ficando em cada gesto, sorriso, aceno de cabeça? O sorriso, as broncas, aquilo que dissemos quando jovens que não queríamos ser, e somos? Alzheimer deveria se chamar ausência. Que se instala aos poucos e tudo nos vai roubando. Mas nos deixou lembranças de hoje e do tempo em que o seu mal não existia. Não leva o que temos na alma, no pensamento;no fim, quem morreu foi ele e toda a vida se tornou mais cristalina.Sua mãe, Márcia, hoje está ilesa e plena.

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  5. Marcia, nesse mais que maravilhoso verso, nessa hora de uma triste e eterna lembrança, emocionada, te abraço, querida.

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  6. Olá Marcia!
    Mesmo estando em nosso coração, nossos entes que partiram, aparecem de surpresa em visões e lembranças de momentos marcantes de nossa união.
    Lindo texto.
    Abraços!

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  7. Amiga, nesta hora talvez as palavras do poeta amenizem um pouco o sofrimento: "Morrer é apenas não ser visto. Morrer é a curva da estrada" - Fernando Pessoa. Que D. Nilze e Ícaro estejam cercados de luz e que os possamos reencontrá-los algum dia.
    Beijos, Leila

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  8. Deveria, "a dona das gentes" vir de impacto, sopetão, em nosso melhor momento... mas às vezes, dispersa e inconsistente, nos vai retirando bocadinho a bocadinho, como se entre eles se esquecesse dos menestéres do ofício... Beijos, muito carinho.

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  9. As mães deviam ser eternas e, de certo modo, são-no porque continuam presentes no nosso coração, nas nossas recordações, no nosso caráter.
    Expresso-lhe os meus sentimentos, nesta hora de pesar.

    Ruthia d'O Berço do Mundo

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