quarta-feira, 17 de abril de 2024

CORAÇÃO ARLEQUIM, de Márcia Sanchez Luz - Prefácio de Leila Míccolis

Para além dos guizos

Em tempos de fusões e hibridismos, é uma delícia ler um livro que lida com formatos poéticos rapidamente identificáveis. Por constituir-se de uma poesia que prescinde de modismos para parecer conectada com a atualidade, CORAÇÃO ARLEQUIM consegue dizer o que tem para dizer de forma clara, sem precisar apelar para nenhuma estratégia. Eis um dos diferenciais deste livro: ele é o que é, sem precisar inventar ser outra coisa. Atualmente, a clareza da mensagem poética é um atributo cada vez mais raro, e a autora destaca-se exatamente por ter uma obra acessível a diversos tipos de público, sem cair nas armadilhas do simplismo.

Os poemas da primeira parte do livro abordam temáticas diversas com leveza, mas também com veemência quando se direcionam a graves problemas sociais. A flexibilidade estilística de Márcia Sanchez Luz não se atém apenas a um formato, propiciando-nos uma leitura repleta de variados ritmos e tons: na maioria são poemas minimalistas – tercetos, trovas, haicais e poemas curtos –, embora os maiores, como Quarentaine, sejam igualmente intensos.

Para restringir-me ao mínimo de spoiler possível, anteciparei apenas dois poemas do bloco poético inicial:

 

Ocaso de inverno: 

sol em fogo, apaixonado, 

deita e apaga as árvores.

 

Modernidade líquida 

 

Deu pane

no liquidificador 

atômico.

 

O primeiro exemplo ilustrativo é um haicai com métrica 5 – 7 – 5 e kigo de inverno, ou de tarde (o kigo é a palavra que liga o poema a uma das quatro estações ou a manifestações da natureza). Frise-se a riquíssima metáfora de um poente que vai lentamente apagando a sua claridade para as árvores poderem dormir e descansar. Neste dégradé de matizes, a cena é delicada, como o gesto de carinho de um amigo ou pai amoroso. Não há tristeza, apenas beleza; o crepúsculo não inquieta, nem entristece; ao contrário, enternece, despertando em nós enorme paz interior. Uma outra interpretação deste haicai, propiciada pela conotatividade da linguagem poética, é a imagem do entardecer de um afeto que vai lentamente esmaecendo, mas que traz em si a possibilidade de ressurgir forte e belo em alguma nova manhã.

O segundo poema, escrito em um tom bastante diferente do primeiro, possui um compasso elétrico, acelerado, condizente com a nossa atual Modernidade Líquida: uma ótica impactante e gigantesca do que o mundo se transformou, misturando/triturando/picando nossas mais significativas experiências cotidianas, diluindo perspectivas, anseios, e sentimentos sólidos – chegamos quase a ouvir o som incômodo e frenético das hélices girando em alta velocidade. O título é uma referência à teoria desenvolvida em obra homônima por Zygmunt Bauman, na qual o filósofo aborda a liquidez, o escoamento, o descarte fácil e inconsequente dos bens consumidos, originando um fenômeno que atinge não só os objetos, como também os relacionamentos humanos.

Na segunda parte de Coração Arlequim aparecem os sonetos, modalidade que a autora ama e que é considerada “démodée, fora de moda” por muitos, como se a poesia precisasse desfilar em passarelas. Como qualquer outro formato poético, o soneto é atemporal e eterno, não tem como objetivo principal vestir-se das tendências atuais ou perseguir efêmeros quinze minutos de fama (Andy Warhol já entendia de Modernidade Líquida…). É uma forma fixa que requer habilidade, talvez por isto mesmo seja mais fácil rejeitá-lo do que fazê-lo. Além do mais, em tempo de inclusões, exclui-lo de forma tão  radical parece-me um terrível contrassenso. Aplaudo então esta corajosa iniciativa da autora de exercer sua liberdade de expressão de forma ampla, para além dos preconceitos estéticos, achismos e fugazes invencionismos.

 

DesenCANTO

 

Tu és meu sonho descalço, 

meu travesseiro rasgado

nos dias frios, gelados

de outono em que me desfaço 

 

por conta do horror que passo

quando passas ao meu lado

com tua ira, com teus brados,

com teu olhar de rechaço.

 

Não sei se um dia terei 

força e coragem de sobra

para mudar minha sina:

 

destino que camuflei,

pensando que fosse obra

ou ventura de menina. 

 

Eis uma voz lírica sem pieguismo, que parte do “eu” individual para chegar ao “nós” coletivo, abrangente e  múltiplo.

Originariamente, o papel dado aos arlequins era cômico, divertido, leve, engraçado, destinado exclusivamente ao riso fácil; entretanto, as posturas e atitudes deles foram sofrendo radicais transformações segundo os atores que o interpretavam, e com o tempo tornaram-se zombeteiros, irônicos, irreverentes, provocativos, satíricos, inclusive questionando a estrutura política da época, como lídimos representantes do povo em oposição à pompa e à majestade da realeza. Porém de repente, “não mais que de repente” (diria Vinícius), pergunto-me curiosa como Arlecchino terá chegado até a poesia de Márcia. Sinto que precisarei entrar mesmo que rapidamente na vida pessoal da autora, para tentar encontrar alguma resposta plausível.

Compactar em duas ou três frases o currículo de Márcia Sanchez Luz é missão impossível, nem tentarei – até porque meu intuito é outro. Digo apenas, então,  que em sua bagagem, para além de escritora com vários livros publicados e já com uma consolidada trajetória literária, ela é professora e tradutora de inglês e francês, e  empresária, proprietária de uma boutique de roupas na cidade onde mora. Eureka!, aí está, achei!!! Embora este último dado pareça totalmente irrelevante e supérfluo, é justamente através dele que percebo o elo de ligação da autora (consciente ou inconscientemente) com  arlequim, cujo traje contém as “mil dobras de sua personagem alegórica”, no dizer do filósofo e historiador de arte Didi-Huberman. A vestimenta que o personagem usa o articula de imediato à sua dimensão simbólica: os “remendos” da indumentária (no começo  remendos reais, feitos para tapar os puídos e rasgões no tecido) sugerem peças do seu ambíguo jogo de duplos – algo que foi feito e refeito, montado e remontado, revelado e escondido de si mesmo e dos outros. Muito do comportamento da figura de Arlequim expressa-se/oculta-se em seu figurino, também no uso da máscara, acessório que indica certo grau de disfarce e de mistério a serem desvendados. Já estampados em suas vestes, portanto, costuram-se o real e o imaginário, a ação e a ficção.

Não é à toa que artistas de todos os tempos seguiram as pegadas que conduziram à entrada deste secreto universo arlequíneo; nas artes plásticas a lista é extensa, citarei apenas dois deles: Matheus Da Costa, com seu Arlequim/soldado urbano e Picasso, que desde 1901 interessou-se por eles, e que os amou tanto a ponto de pesquisá-los e incorporá-los em várias fases da sua pintura, inclusive no retrato do seu filho Paul Joseph, em 1924. Na poesia e na dramaturgia também são inúmeros os criadores fascinados por arlequins: nossos Ariano Suassuna, Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Menotti del Picchia, e o dramaturgo italiano Carlo Goldoni, dentre muitos outros.

Não se fixem pois, prezados leitores, em um único aspecto deste personagem, bem mais complexo do que à primeira vista aparenta, pois é esta riquíssima multiplicidade sensória do Arlequim a principal responsável pela sobrevivência dele entre nós até hoje. Desconstruindo justamente esta ideia reducionista de um Arlequim somente burlesco, a poesia de Márcia Sanchez Luz o desloca para a realidade dos dias atuais, transformando o personagem fictício em ser humano vivo, ao captar-lhe não só os instantes de alegria, mas também os de tristeza, reflexão, dúvida, incerteza, solidão, contemplação e lirismo, dentro do contexto de um theatrum mundi transformado aos nossos olhos, surrealisticamente – como observa a autora –, em potente liquidificador cada vez mais desgovernado. No fundo, o presente livro nos mobiliza tanto porque somos esse Arlequim compartilhando as memórias do nosso coração, e querendo criar novas memórias mais alegres com tudo e com todos.

 

Leila Míccolis
Pós-graduada em Escrita Criativa; Doutora e com Pós-doutorado em Teoria Literária (UFRJ); escritora de livros, TV, teatro e cinema

Cândido Mota, 29/6/2022

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O livro “Coração Arlequim”, de Márcia Sanchez Luz, pode ser adquirido no site da Arribaçã no seguinte link: http://www.arribacaeditora.com.br/coracao-arlequim/ ou com a autora através do email: marciasanchezluz@gmail.com.

domingo, 12 de fevereiro de 2023

DE OLHO NA ESTANTE: Coração Arlequim: uma experiência atópica do outro

Por Johniere Alves Ribeiro



















 

“Coração Arlequim” é o título do novo livro da veterana poeta Márcia Sanchez Luz. Uma obra que nos coloca entre temas e formas que hibridizam aspectos da contemporaneidade mais cotidiana do leitor, tal como a liquidez da vida moderna; quanto elementos formais, a exemplo dos tradicionais sonetos, trovas e haicais, bem como da liberdade dos versos incentivados pelas 

poeiras de 1922.  

Outra soma nos chama a atenção em  “ Coração Arlequim” o título e capa.

Quanto ao título me veio à mente a remissão direta a Arlequim. Personagem que surgia nos intervalos das Commedia Dell’arte italianas. Figura que ficou incorporada ao imaginário popular que acabou se conectando ao espectro cósmico do carnaval.  No sentido restrito, a festa de momo brasileira. Mas no sentido do qual teorizou Mikhail Bakhtin, que defende a carnavalização como a inversão da pirâmide social. Desta maneira, Arlequim seria um exemplo disto, pois ganha posição de destaque tanto na sociedade como em nosso campo simbólico, sai do intermezzo das cortinas, do palco, das coxias para ocupar outra lugaridade. Já que o espaço do Arlequim na comédia italiana era secundário, figura que ajudava a entreter o público, mas gradualmente foi ganhando centralidade nas peças. Daí em diante, já sabemos sua história: Roubou Colombina do apaixonado Pierrot, conquistou o coração de Colombina, contudo nunca a ela se apegou. Seu discurso era:

 

“Quero viver neste mundo

como quem vive só um dia:

cada fração de segundo,

fugaz como a estrela-guia” ( De musas e colombinas, p,51)

 

O que se observa é que Arlequim, com sua roupa colorida em losango, era adepto de um carpe diem, da pior qualidade, daquela praticada no declínio de Roma: um carpe diem calcado no mero hedonismo e pura diversão.

Arlequim é ambíguo. Escorregadio. Sedutor. Nesse sentido, é sinônimo também de: farsante, irresponsável, brigão, valentão e bufão.

 

Não há porque cobrar de ti, amor,

o que tampouco posso dar de mim.

Posso porém pedir, veja-me assim

como semente forte em viço e cor

 

a alimentar teus sonhos de Pierrô,  

quem sabe até quimeras de Arlequim

(todo vestido em tiras de cetim)

que após sorver um gole de licor.  (Mascaradas, p. 69)

 

Daí, talvez, sua carnavalidade vir sempre à tona ano a ano. Todas essas caracterizações o desloca do anonimato para o centro: daí a “carnavalização”.  Arlequim e as inconstâncias do seu coração ofertam a batida de boa parte dos versos do livro de Márcia Sanchez Luz:

 

Do pranto que me entristece

sugo as lágrimas que correm

dos olhos de um querubim.

 

já do canto que enternece

sorvo as delícias que escorrem

de um coração arlequim  (De musas e Colombinas)

 

Por isso, me conecto neste momento à capa. Uma imagem em primeiro plano nos traz uma espécie de coração colorido, mas constituído por algo parecido como duas interrogações e um pequeno coração com a função de ponto. As interrogações lembram ainda duas claves de Fá, que quando empregada na partitura musical o que entrega ao músico a freita de tocar mais grave seu instrumento. Por exemplo no piano, as oitavas mais graves do piano não têm correspondências em uma pauta na qual a clave de Sol faz parte. Este plano mais grave, mais tenso também, pode ser percebido em alguns, como em: “Agonia” ( p,18); “O sol da meia-noite” ( p. 19); “ Luto” (p.25) “Sinto tanta dor / que ela parece querer / se esconder dentro de mim” , uma boa composição imagética entregue ao leitor, visto que a ideia de aperto causado pela morte, ao ponto de se ”esconder” dentro da gente, de maneira que não a sentimos e não a encontramos de tão forte é a dor.  Ainda quando nos apresenta a tristeza em “Duas trovas premiadas”:

 

Em meio à sua incoerência,

o homem quer entender

o que nem mesmo a ciência

é capaz de esclarecer

 

Se no destino há tristeza,

de encontro às pedras, eu sigo

construindo a fortaleza

que me servirá de abrigo ( p. 28)

 

A dor e a tristeza vão ganhando tons mais graves em poemas como: “Bang Bang Contemporâneo”, “Mundo Insano”, “Constatação”, “Terremoto II”. “Distanciamento”, isto para citar apenas alguns, nessa dicção de Márcia Sanchez Luz.  

Erotismo é paga importante da autora no interior da obra. Em “ Eros e Thanatos”:

 

Quando estou nua sob a luz da lua

penso em teu corpo bem colado ao meu.

Ficar contigo sempre a sós ao léu

faz com que meu receio se dilua. ( p.40)

 

Eros é o que afeta a corporeidade do feminino no poema, traduzido pela imagem da lua. É notória tal relação. É a lua que controla os movimentos das águas dos mares na terra. No poema é a lua que move os fluxos e os interfluxos dos amantes. Visto que o corpo só é corpo com a ideia de movimento:

 

e se transforme em gota que flutua

em meio ao turbilhão varrendo o céu.

Durante o dia tu és um cinzel

moldando-me pra noite eu ser só tua! ( p.40)

 

É o movimento que fabrica a elaboração da corporeidade, de modo que mesmo estático o corpo continua a se mover. Tal como a terra e a própria lua vertida no poema. Daí a potência da vida que se agencia nessa fricção do “turbilhão varrendo o céu” com um ensaio para a moldura daquilo que se espera para a noite: “ ser só tua!”.

Contudo, vale lembrar que a potencialidade da vida não emerge sem a congruência com a morte. Por isso, o título do poema associa Eros e Thanatos, este signo da morte. Mas também é bom trazer a ideia de que o orgasmo, principalmente o clímax feminino, é também reconhecido como:  "La Petite Mort", pequena morte. É o que se observa no seguinte trecho de outro poema: “E eu me sinto nua: / coito prematuro / beirando a ironia / de um dor rainha” ( Fazendo as contas); “ que, mais que o amor, é gostoso / (pois brejeiro e misterioso) / como a brisa a me afagar” ( Spleen); “de amor intenso, cavalgar pulsante / de corpos que se perdem da razão” ( Partitura); “Por vezes este amor me varre os dias / como uma tempestade em pleno estio / a me afogar em medos e fobias” ( Acalanto).

Creio que é sob este aspecto que surge Thanatos, dessa maneira os corpos seguem o fluxo, os fluídos de um continuum entre o céu e o hades, não havendo entre eles fronteiras, nem uma definição de um topos fixo. Nesse sentido, Byung-Chul Han no seu livro “Agonia do Eros” nos indica: “ O outro que eu desejo (begehre) e me fascina é sem-lugar”. Assim, no poema “Eros e Thanatos” é um recado para não perdermos de vista a “experiência da atopia do outro”. Se interpõe como a negação “ a tendência da sociedade de consumo é eliminar a alteridade atópica em prol de diferenças consumíveis, sim, heterotópicas. A diferença é uma positividade em contraposição à alteridade” (HAN, 2020, p. 9).

 

O sol já vai dormir e saboreio

a lua prateando um céu de mago

que nunca vi em sonhos indistintos.

 

Acordo de um profundo sono e sinto

a plenitude desse intenso afago

que pôs um fim a todos meus anseios. (Eros e Thanatos, p. 40)    

 

Por tudo isso dito, é que nós, do DE OLHO NA ESTANTE, indicamos “Coração Arlequim” livro de Márcia Sanchez Luz publicado pela Editora Arribaçã.  

 

* Johniere Alves Ribeiro é professor-doutor e resenhista parceiro da Arribaçã. O texto acima foi publicado na seção “DE OLHO NA ESTANTE”, em seu perfil no instagram: @johniere81

 

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O livro “Coração Arlequim”, de Márcia Sanchez Luz, pode ser adquirido no site da Arribaçã, clicando AQUI

 

domingo, 11 de dezembro de 2022

Novo livro de MARCIA SANCHEZ LUZ - CORAÇÃO ARLEQUIM

 






Gênero: Poesia

Editora: Arribaçã

Autora: Márcia Sanchez Luz

ISBN: 978-65-5854-758-7

Origem: Nacional

Ano: 2022

Edição: 1

Páginas: 120 – papel Pólen Bold 70 g/m2

Acabamento: Brochura

Dimensões: 14 X 21 cm

 

Sinopse: Novo livro de poemas da consagrada poeta paulista Márcia Sanchez Luz. “Em tempos de fusões e hibridismos, é uma delícia ler um livro que lida com formatos poéticos rapidamente identificáveis”, afirma Leila Miccolis no prefácio da obra, que é dividida em duas partes: a primeira com poemas curtos e a segunda com Sonetos. O livro tem concepção da capa de Leila Miccolis, capa de Ingrid Stephane e projeto gráfico de Fábio Oliveira. 


A obra pode ser adquirida diretamente com a autora através de email para: marciasanchezluz@gmail.com (favor escrever COMPRA DE LIVRO no assunto) e também pela Arribaçã Editora http://www.arribacaeditora.com.br/coracao-arlequim/. Para quem prefere no formato ebook, pode adquiri-lo na Amazon.


R$ 40,00


Valorizar poetas vivos é transformar a realidade, colaborando para fazer da arte um ofício que, para além do prazer do reconhecimento, resulte num retorno financeiro.




sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

Márcia Sanchez Luz é entrevistada por Mônica Banderas e Urhacy Faustino para o Post Blog

Agradeço de coração à Mônica Bandeiras e ao Urhacy Faustino pela deliciosa e prazerosa entrevista! Que Deus abençoe a família Blocos (da qual me sinto membro desde que conheci a Leila Míccolis e nos tornamos grandes amigas). Beijos e meu carinho. Para ler a entrevista, bast clicar aqui: Post Blog

quarta-feira, 8 de julho de 2020

terça-feira, 28 de abril de 2020

Terremoto


© Márcia Sanchez Luz


(Img: Salvador Dalí La Main (Les Remords de Conscience)



















Será que o grito ao fim da noite dado
é solução pra tanto desassunto
entre dois seres? Nem por um segundo
há paz quando o respeito é renegado.

Será que o mundo é surdo e acovardado,
vazio, até sem vida, ou moribundo?
Penso que a angústia de que ora me inundo
seja a constatação que, abandonados,

somos menores que o menor dos medos,
somos apequenados pelos outros
que empenham-se em mostrar que não podemos

sequer criar nossos próprios enredos
onde é possível ver crescerem soltos
anseios que jamais abraçaremos.

sábado, 11 de maio de 2019

POESIA PARA MUDAR O MUNDO - versão impressa da Editora Blocos




Leila Míccolis e Urhacy Faustino, nadando contra a corrente, o que é fantástico, reativam a Editora Blocos e publicam em papel e tinta a Antologia POESIA PARA
MUDAR O MUNDO, antes publicada em versão digital no Portal Blocos Online.


É com imenso prazer que partilho essa notícia e me sinto honrada por participar dela junto a grandes poetas da atualidade.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Desvario - Em memória de Ricardo Boechat
















Hoje perdemos Ricardo Boechat, jornalista e ser de primeira grandeza. Fica um vazio imenso, um desejo de que tudo não passasse de um pesadelo, um engano...mas não! Ele se foi, e com ele se foi o que havia de mais transparente no jornalismo... Muito triste...

Posto humildemente este soneto em sua memória

Desvario
© Márcia Sanchez Luz

Será que nesta vida tão doída
Existe algum lugar que delimite
A perda que maltrata em despedida
E a voz que sempre fere e impõe limite?

Não sei qual a razão de tanta lida
se o que magoa enfim não nos permite
banir o açoite turvo na acolhida
das noites, no silêncio que se omite!

Burlar a escuridão é desvario:
o claro que se apaga e mostra a dor,
não vai trazer a paz – é luta em vão!

Postergo e avilto a morte, fantasio
que tudo enfim será cultivador
de um mundo desprovido de aflição.

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Pura Rima

© Márcia Sanchez Luz


Tela de Tomasz Kopera















Mesmo se dissesse
que o que me entristece
não é tua fala
pois que a boca cala
e o ouvido cerra
o que nela encerra...
Se em mim fascina
teu olhar que insiste 
tantas vezes teima
em não concordar
que não somos mais 
olhares gulosos...

Se tua mão que afaga
já não é tão fina
mas que é pura rima
de nossos desejos 
amadurecidos
e já transformados...
Assim não podemos 
porquanto crescemos
e juntos gozamos 
prazeres intensos
de sol e de lua...
Minha boca, que é tua,
só tua!
Sou tua...